Paralisada há 5 anos, estrada de ferro sumiu entre casas e matagal em Santana

Antiga ferrovia tomada pelo mato e casas ao redor
Era tarde do dia 27 de fevereiro de 2014 (numa quinta-feira), quando a locomotiva nº 1201 ‘cortava’ o cruzamento da Rua Everaldo Vasconcellos, no bairro Fonte Nova, em Santana.

Naquele momento, o trânsito de carros e motos parava por alguns minutos, vendo a composição de vagões sendo puxada pela locomotiva sobre a precária ferrovia. 

“Quem viu a locomotiva passando naquele dia, teve a chance de testemunhar sua despedida”, declamou o amapaense Adamor Ferreira, de 39 anos, ex-soldador industrial.

Adamor reside em Santana e trabalhou por quase três anos na empresa Anglo Ferrous, a concessora da ferrovia que ligava quatros municípios amapaenses, e antiga propriedade da mineradora ICOMI. 

O amapaense conta ter sido um dos últimos a trafegar na locomotiva pela histórica ferrovia que por mais de seis décadas carregou milhares de pessoas e centenas de toneladas de minérios, que seriam despejados em um cais localizado em frente ao extenso Rio Amazonas, para assim embarcar em navios comerciais para o exterior. 

Trem circulou por ferrovia até 2014
“Não vivíamos um momento tão positivo, mas enfrentamos uma fase bem mais pesada depois que o porto desabou em 2013. Tivemos salários atrasados, além de vários benefícios cortados”, relembra. 

Além do ex-soldador, moradores que residiam em colônias que ficavam ao longo dos quase 200km de ferrovia vinham semanalmente à Santana para comercializar seus produtos hortigranjeiros. 

Casas erguidas na beira da ferrovia desativada
A aposentada Sandra Amaral, de 63 anos, é uma dessas que atravessou quase meio século em viagens litorinas entre Pedra Branca do Amaparí e a cidade portuária de Santana. 

“Cresci viajando de trem e me orgulho disso. Vínhamos pra estação da Pedra Branca às 4h da manhã e chegávamos em Santana na hora do almoço (depois do meio-dia), pra trazermos carne de caça, bananas, coco e muita verdura. Era uma viagem cansativa mas bonita”, conta Amaral. 

Atual situação 
Diante dessas duas lembranças divididas em épocas distintas – entre o ex-soldador e a aposentada – o que hoje existe são apenas relatos de uma ferrovia que atualmente vive outra realidade. 

Nos trechos que atravessam a saída de Santana, pelo bairros Paraíso e Fonte Nova, os caminhos traçados que um dia viram uma linha ferroviária – que funcionou entre 1957 até 2013 – estão agora tomados pelo matagal alto e por inúmeras moradias que foram se erguendo ao longo das últimas três décadas. 

Em um desses perímetros que o blog Santana Do Amapá conversou com a doméstica Deuzarina Santos, de 35 anos, que reside na área que considera o ‘limite’ com a ferrovia. 

A doméstica conta ter ocupado o atual espaço há mais de 14 anos, onde mora com o esposo e mais cinco filhos, com idades entre 9 e 17 anos. 

“Houve um tempo que tentaram nos tirar daqui, alegando que estávamos desrespeitando o limite dos trilhos, mas depois de várias audiências, a justiça determinou que ficássemos por não termos para onde ir”, disse a doméstica. 

Além de Deuzarina, um levantamento realizado pela Prefeitura de Santana em 2016 estima que existam em torno de 6 mil famílias que residem nos chamados ‘limites da linha ferroviaria’, distribuídos entre os bairros Paraíso, Fonte Nova e Jardim de Deus. 

Após a paralisação das atividades da última concessora da ferrovia – Zamin Ferrous – não apenas o intenso matagal e o crescimento desordenado de moradias invadiriam o espaço de um importante pedaço da nossa recente história amapaense, mas que também seria alvo de constantes registros de roubos e deteriorações físicas. 

Não é difícil de encontrar trechos da ferrovia do Amapá que sofreram vandalismos e ações de furto dos trilhos, uma atitude que deixa entristece até os mais pioneiros que participaram de sua construção. 

“Tanto trabalho de homens que queriam deixar um pedaço importante para nossa história, mas que ninguém se manifesta para manter ou preservar em funcionamento”, lamentou o aposentado Wilson Batista, de 72 anos, ex-funcionário da ICOMI, empresa que construiu a ferrovia. 

O blog entrou em contato com a Procuradoria Geral do Estado (PGE) que informou está acompanhando há três anos a situação sobre o atuais concessores da ferrovia, mas que depende uma decisão da justiça de São Paulo (SP) para saber a quem vai pertencer a sua futura manutenção.

Comentários

  1. Pelo que sugerem algumas das fotos, alguns trechos da ferrovia foram asfaltados. Se for isso mesmo, por certo teve o apoio da Prefeitura de Santana. A vantagem é que o asfaltamento evita que esses trechos sejam invadidos e ocupados para moradias, as quais, depois, na retomada da atividade da ferrovia, ninguém conseguirá remover.

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