“O Barranco”: A imprensa de Santana surgiria por ideia desses operários da ICOMI

O jornal era produzido de modo artesanal
Bastou a intenção de um grupo de jovens funcionários lotados na Indústria e Comércio de Minérios Ltda (ICOMI) para que um simples informativo viesse a se tornar o ponta-pé inicial da história da imprensa em Santana. 

Ao se reunirem nos finais-de-semana, durante passeios pitorescos em terrenos particulares ou até mesmo por ocasião de uma descontraída partida de futebol no gramado do Estádio do Santana Esporte Clube (hoje Estádio “Augusto Antunes”), os trabalhadores novatos da mineradora, nomes como Aurílio Lima, Edison Santos, Reynaldo Pinto, Gutemberg Menezes, Álvaro França, Francisco Lima e Manoel Araújo, juntariam suas idéias e criariam um excêntrico jornal denominado “O Barranco”, na qual seria o órgão pioneiro do jornalismo amador na ICOMI. 

Oficialmente fundado na manhã do dia 07 de julho de 1963, carregava estampado em sua capa o seguinte slogan: “O Barranco: Jornaleco Semanal da Turma do Barranco”, contando com o talento comunicativo e literário desses 07 operários icomianos que semanalmente marcavam uma reunião para assim juntarem as informações colhidas durante a semana e debaterem somente as notícias que seriam posteriormente publicadas.

Mesmo não havendo uma sede fixa para seu funcionamento, sua equipe editorial não media esforços para se reunirem, ora na cantina da empresa ICOMI, ora na casa de algum de seus redatores, onde buscavam fechar a edição semanal ainda nos dias de quinta ou sexta-feira, para que todo esse material selecionado fosse diagramado e formatado – através de um processo manual contendo apenas uma máquina de datilografia “Olivetti” e um aparelho mimeógrafo (gentilmente cedido pelo Departamento de Recursos Humanos da ICOMI), onde eram produzidos e editados os mais de 100 exemplares do jornaleco. 

O semanário não tinha imagens fotográficas, apenas gravuras explicativas que acompanhavam os textos impressos. 

Mas com estas humildes ferramentas, “O Barranco” mostraria sua capacidade de informar, quando inicialmente circularia apenas nas dependências internas da mineradora, e após algumas semanas conquistando novos leitores, ampliaria seus objetivos de comunicação local, indo registrar os acontecimentos sociais e religiosos do núcleo populacional da Vila Drº Maia. 

Deste núcleo foram publicados diversos acontecimentos notórios, como: o primeiro plano urbanístico para a Vila Drº Maia (1963); a abertura de novas ruas e avenidas que interligariam a Vila Amazonas com a Vila Drº Maia (1963); as primeiras reuniões estatutárias do Independente Esporte Clube (1963); o remanejamento das famílias das áreas da Olaria para uma área na Vila Drº Maia (1964); o interesse de técnicos da ICOMI para implantar uma emissora de TV no Amapá (1967), entre outras notícias. 

Vale ressaltar que o semanário consistia, na verdade, de apenas duas páginas (frente e verso) que eram divididos por assuntos diversificados, como notícias comunitárias, notas de reuniões sociais, seção de esportes e seção literária. 

Era uma publicação bem modesta, mas bastante eficiente, justamente por contar um pouco do desenvolvimento social e econômico que vinha consideravelmente se expandindo pelos núcleos urbanos que posteriormente formariam o atual município de Santana, onde se incluía comentários críticos e elogiosos sobre alguns desses importantes fatos para a comunidade santanense. 

A idéia em levar o projeto de informar com o jornaleco era tão determinante que os gastos na produção e distribuição (gratuita) do folhetim eram custeados por seus próprios realizadores, recebendo em troca apenas o prestígio de terem levado a informação ao conhecimento popular. 

Segundo informações repassadas pelo saudoso Manoel Araújo, as edições eram distribuídas em blocos de 20 exemplares na Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro (próximo a Vila Amazonas) e nas duas únicas escolas existentes na Vila Drº Maia, que eram: Escola Barroso Tostes e Escola Porto de Macapá (hoje Escola Amazonas). 

No final de 1965, a circulação do jornaleco passou a ser quinzenal devido o custo com sua publicação ter ficado sob responsabilidade de apenas três colaboradores, mas ainda mantendo a mesma linha editorial com suas seções e informações a serem divulgadas. Buscando discutir os variados assuntos que repercutiam constantemente entre a capital Macapá e as vilas adjacentes da ICOMI, o Padre Ângelo Biraghi passou a contribuir com seus artigos religiosos e textos de opinião como forma de estabelecer suas idéias de líder eclesiástico na região e buscar soluções para os problemas sociais existentes em Santana.

Foi justamente em um artigo de autoria do padre Biraghi, publicado na edição n.º 29 do jornaleco “O Barranco”, da segunda quinzena de janeiro de 1966 (depois reeditado em 1973 no jornal “A Voz Católica”), que a prostituição descontrolada na área portuária de Santana foi levada ao conhecimento das autoridades competentes, sendo com isso, tomado providências com ações de retiradas de bares irregulares e empregado um horário limitado para manterem tais estabelecimentos abertos durante o horário noturno. 

A repercussão do artigo foi que popularizou a existência de prostíbulos na zona portuária de Santana, quando antes essa fama estava voltada para a Doca da Fortaleza (em Macapá). 

O surgimento de novos periódicos que vinham da capital (Macapá) e até mesmo a falta de investimentos de novos colaboradores forçaria o jornaleco santanense a reduzir sua tiragem (para 50 exemplares por edição) e passaria a circular mensalmente a partir de outubro de 1965, mas ainda mantendo seu estilo de informar os principais acontecimentos sociais das Vilas Dr.º Maia e Vila Amazonas. 

Em maio de 1967, depois de um longo período de insistentes e complicadas formas de manter sua circulação, o folhetim “O BARRANCO” encerraria definitivamente suas atividades em prol da informação comunitária local, mas deixando seu nome escrito na história das comunicações de Santana. 

Até o início do ano de 2001, era possível encontrar alguns exemplares raros desse jornal na Biblioteca Pública Municipal de Santana para consulta pública, assim como outros materiais que descrevem a evolução histórica da comunicação do município. 

Porém, com o fechamento temporário da biblioteca e suas constantes reformas físicas, tais jornais foram inexplicavelmente extraviados, apesar das diversas tentativas de localização desses materiais durante processo de levantamento patrimonial do acervo existente naquela instituição bibliotecária.

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